Existem três tipos de prevenção: a primária, em que se busca evitar que a doença se desenvolva (prevenção de fato), a secundária, que compreende as ações voltadas para o diagnóstico e o tratamento mais precoce da doença, e a terciária, que se dá no tratamento da doença plenamente instalada, visando reduzir sintomas e reabilitar o paciente.
Neste texto, vamos nos referir às duas primeiras, uma vez que a maioria dos casos de câncer está relacionada a fatores ambientais, ou seja, ao estilo de vida das pessoas. Uma estratégia efetiva de controle deve, portanto, abordar a transformação desses hábitos, o que tem se mostrado muito difícil.
Sabemos hoje que mudanças no estilo de vida podem ter um enorme impacto na incidência do câncer. O principal exemplo disso é o câncer de pulmão, que seria reduzido em 90% caso não existisse o tabaco.
Abaixo, indicamos algumas recomendações com eficácia comprovada na redução de risco. Em seguida, discutiremos alguns desses tópicos.
Recomendações:
- Não fume.
- Faça exercícios regularmente.
- Mantenha seu peso próximo do ideal.
- Faça uma dieta rica em frutas, vegetais e cereais integrais.
- Consuma com moderação alimentos ricos em gorduras saturadas e evite alimentos com gordura trans.
- Não abuse do álcool.
- Proteja-se de doenças sexualmente transmissíveis.
- Não se exponha excessivamente ao sol.
Muitos desses cuidados são igualmente efetivos na prevenção de outras doenças, como diabetes e doenças cardiovasculares, por exemplo.
Uma dieta rica em frutas, legumes e verduras, e pobre em gordura animal e alimentos industrializados, é um hábito recomendável para a prevenção do câncer.
Atividade física
Vários estudos conseguiram demonstrar a redução na incidência do câncer de mama, como por exemplo, pela prática regular de exercícios. A diminuição de risco pode variar de acordo com o subtipo, superando 40%.
Foi também possível comprovar tal redução de até 50% para o desenvolvimento do câncer de cólon, também pela prática de exercícios. Esse benefício pode se estender para outros tumores, como próstata, pulmão e útero.
Isso pode ser explicado pela prevenção da obesidade, pelo restringimento dos níveis hormonais e dos processos inflamatórios, pela reversão da resistência à insulina e da ativação do sistema imunológico.
Recomenda-se a realização de atividades físicas, de quatro a cinco vezes por semana. O tipo, a intensidade e a duração das mesmas devem ser definidos de acordo com o grau de condicionamento e as limitações individuais.
Fumo
O cigarro é o agente cancerígeno mais importante do mundo. Inúmeros estudos científicos realizados ao longo do século XX, demonstraram a relação de causa e efeito entre cigarro e diferentes tipos de câncer.
Não fumar e evitar ficar exposto à fumaça do cigarro, são atitudes de enorme impacto para a prevenção do câncer de pulmão e de vários outros, como bexiga, colo do útero, esôfago, boca e garganta, além de outras doenças.
Álcool
Apesar das evidências de que o consumo moderado de álcool pode reduzir o risco de doenças cardiovasculares, a ingestão excessiva aumenta a probabilidade de desenvolver alguns tipos de câncer, especialmente quando associado ao tabagismo e dietas pobres em frutas e verduras.
Sol
A quantidade de sol necessária para a manutenção dos níveis de Vitamina D varia conforme as características da pele, a idade, a época do ano, a área exposta, entre outros fatores. O tempo essencial de exposição é estimado entre 5 e 30 minutos, três vezes por semana, sem o uso de filtro solar, no início da manhã ou no fim da tarde.
A luz solar, entretanto, está relacionada ao desenvolvimento de diferentes tipos de câncer de pele. Por isso, a exposição mais prolongada ou fora do horário ideal deve ser feita com o uso de protetor solar.
Agentes infecciosos
Evitar infecções por certos agentes é importante para prevenir o desenvolvimento de vários tipos de câncer. Dois vírus vêm sendo frequentemente envolvidos nesse contexto: o HPV, associado ao câncer de colo uterino, de pênis, do ânus e da garganta, e o da hepatite B, relacionado ao câncer de fígado. Felizmente, existem vacinas efetivas contra os dois vírus.
A prática de atividades físicas de forma regular diminui o risco de contrair várias doenças, entre elas, alguns tipos de câncer.
Rastreamento
O diagnóstico precoce pode aumentar as chances de cura de vários tipos de câncer. Para essas doenças, realizar exames preventivos regularmente, mesmo quando não há sintomas, pode permitir a detecção de lesões pré-malignas e malignas em estágios iniciais, alterando de forma significativa as perspectivas dos pacientes.
Os testes considerados padrão para rastreamento populacional são:
- Mamografia, para todas as mulheres, anualmente, a partir dos 40 anos.
- Exame papanicolaou (colo do útero), anual, após início de vida sexual.
- Colonoscopia, para ambos os sexos, a partir dos 50 anos.
Outros exames de rastreamento devem ser considerados, levando em conta o histórico pessoal e familiar, incluindo avaliação da incidência de diferentes tipos de câncer na família, o diagnóstico prévio de lesões precursoras ou malignas e antecedentes pessoais que indiquem um risco aumentado para determinadas neoplasias (como o tabagismo).
Vale destacar a controvérsia, ainda atual, sobre o rastreamento do câncer de próstata. Atualmente, a conduta mais aceita é direcionar a pesquisa de acordo com o risco individual, abandonando o rastreamento populacional.
Cirurgia preventiva
Mutações específicas nos genes BRCA1 e BRCA2 expõem seus portadores a um risco muito aumentado para desenvolver determinados tipos de câncer, especialmente os de ovário e de mama. Para esses pacientes, discute-se a retirada dos órgãos, antes que a doença se desenvolva. Esta é a cirurgia preventiva, que tem recebido grande atenção da mídia leiga.
Algumas síndromes hereditárias determinam uma ameaça muito alta de desenvolvimento do câncer de cólon. Nesses casos, a retirada do intestino pode ser indicada como forma de prevenção.
Nos dois casos mencionados, não se trata de condutas consideradas padrão. Em vez disso, são casos complexos, que devem ser acompanhados de perto e decididos individualmente, com a participação do paciente.
A retirada de lesões pré-malignas, como pólipos do intestino grosso, pode também ser considerada uma cirurgia preventiva. Nesse caso, altamente eficaz.
Quimioprofilaxia
O emprego de medicamentos para evitar o desenvolvimento de câncer é chamado de quimioprofilaxia. Seu uso é limitado a situações de risco muito alto. Atualmente, mais de 400 agentes vêm sendo testados nesse contexto pelo National Cancer Institute (NCI) dos Estados Unidos.
Os melhores resultados em quimioprofilaxia, até o momento, foram alcançados nos casos de tumores sensíveis à ação de hormônios: mama e próstata. Os tratamentos empregados bloquearam a ação hormonal sobre as células que poderiam se tornar malignas, impedindo, assim, o pleno desenvolvimento da neoplasia. Além disso, estudos evidenciaram uma redução de risco de câncer de intestino com uso regular de anti-inflamatórios, como o ácido acetilsalicílico.
A quimioprevenção é uma estratégia que deve ser aplicada caso a caso, considerando-se, cuidadosamente, seus riscos e possíveis benefícios.
O papel do oncogeneticista
O oncogeneticista é o médico especialista em reconhecer os indivíduos com predisposição genética a algum tipo de câncer e identificar as alterações genéticas associadas a esse aumento de risco.
De forma geral, o profissional faz uma investigação minuciosa sobre a história familiar do paciente, considerando pelo menos três gerações, para verificar a incidência de tumores e definir se na família existe, de fato, um risco hereditário para o desenvolvimento de câncer. A partir disso, desenha a estratégia diagnóstica mais adequada, para esclarecer se o indivíduo carrega uma alteração genética que aumente o risco de neoplasia.
Com base nessas informações, o médico orienta o paciente sobre as medidas de rastreamento e prevenção mais adequadas.